Avatar - The Way of Water e o bilinguismo bimodal
Por Pedro Henrique Witchs
Vitória, 15 de dezembro de 2022
A primeira sequência do longa-metragem de ficção científica Avatar (2009), Avatar – The Way of Water (2022), do diretor James Cameron, acaba de estrear no Brasil e nos leva de volta aos conflitos entre na’vi e humanos em Pandora, uma exolua do planeta fictício Polyphemos situada no sistema de Alpha Centuri.
Um aspecto interessante sobre os na’vi, os famosos seres azuis da franquia, é que eles falam sua própria língua, o na’vi. Da mesma forma que outras línguas artificiais criadas para a ficção — como o utopiano (criado por Pieter Gillis em 1516 para Utopia, de Thomas More), as línguas élficas (de J. R. R. Tolkien) ou o klingon (criado por Marc Okrand para a série Star Trek) —, a língua na’vi foi criada pelo linguista Paul Frommer e deveria soar como nenhuma outra língua humana ao mesmo tempo que precisava ser pronunciável pelo elenco do filme.
Em Avatar – The Way of Water, somos apresentados ao clã Metkayina. Esse clã é formado por na’vi que habitam uma região de recifes da exolua e, portanto, desenvolveram uma forma de vida estreitamente relacionada com as águas. Um aspecto linguisticamente surpreendente sobre os na’vi marinhos é que eles são bilíngues. Além do já conhecido na’vi — língua de modalidade vocal-auditiva compartilhada entre os na'vi —, o clã Metkayina também fala a língua de sinais na’vi (LSN ou na’vi sign language - NSL) – que é uma língua de modalidade gestual-visual falada principalmente em interações subaquáticas e também em interações com alguns animais marinhos de Pandora. Por falarem línguas de modalidades de expressão e compreensão diferentes, os na’vi do clã Metkayina podem ser considerados bilíngues bimodais.
O termo bilinguismo bimodal, segundo Lillo-Martin, Quadros e Pichler (2016), é usado para descrever bilíngues cujas línguas se manifestam em diferentes modalidades articulatórias. As autoras exemplificam isso com dois pares linguísticos: a língua de sinais americana (ASL) e o inglês, ou a língua brasileira de sinais (Libras) e o português brasileiro. A presença de modalidades diferentes, conforme Quadros e colaboradoras (2020, p. 373), “implica em uso e combinação das duas línguas que podem coincidir ou não com os usos feitos por bilíngues unimodais”. Uma especificidade do bilinguismo bimodal é a sobreposição de línguas (code-blending), “possível exatamente como consequência de duas línguas se apresentarem em modalidades diferentes acessando canais que permitem e favorecem a sobreposição” (QUADROS et al., 2020, p. 373).
A língua de sinais na’vi foi desenvolvida pelo ator, produtor, diretor e escritor surdo C. J. Jones. No canal Avatar, do YouTube, é possível acessar uma playlist de vídeos, nos quais Jones ensina alguns dos principais sinais da LSN presentes no filme. Esta é, sem dúvida, mais uma alegria para as comunidades surdas ao redor do mundo, que cada vez mais podem ver aspectos de suas culturas no cinema.
E você? Também está interessado em aprender a língua de sinais na’vi?
Referências
LILLO-MARTIN, Diane; QUADROS, Ronice Müller de; PICHLER, Deborah Chen. The Development of Bimodal Bilingualism: Implications for Linguistic Theory. Linguist Approaches to Bilingualism, v. 6, n. 6, p. 719-755, 2016.
QUADROS, Ronice Müller de; LILLO-MARTIN, Diane; KLAMT, Marilyn Mafra; PIRES, Karina Tasso. Estudos experimentais com bilíngues bimodais: aspectos metodológicos. Revista Linguística, Rio de Janeiro, v. 16, n. 3, p. 372-403, 2020.